CRÍTICA - JEAN CHARLES - Em épocas onde
imobilizar nosso inimigo não basta, é preciso
aniquilá-lo, como se assim fossemos ilusoriamente
imunes aos males da vida, a lei do retorno, se faz
presente em cada atitude impensada, infundada e
impulsiva de violência, que a cada dia só faz
aumentar as estatísticas de crimes, que poderiam ter
sido evitados. “Jean Charles” vem para corroborar
com a paranóia nossa de cada dia, além de expor sem
meias palavras nosso desamparo no mundo.
O caso de Jean Charles morto em 2005 equivocadamente
pela policia britânica no metrô, expõe o sonho de
muitos imigrantes de obter sucesso, convertidos em
valores financeiros, numa terra estrangeira, além de
expor a fragilidade de sistemas públicos como o de
segurança. O mundo está tão violento que primeiro se
atira para depois se perguntar algo. No caso de Jean
Charles brutalmente e covardemente assassinado, as
palavras não lhe serviriam para nada.
O filme de Henrique Goldman cumpre a função de
retratar a vida do brasileiro comum que vai para o
exterior a procura de melhorias financeiras, que dá
um jeitinho brasileiro a tudo que encontra pela
frente e que se vê indefeso e inseguro, diante de
tanta adversidade e descaso alheio.
O valor de R$ 60 mil reais que a família de Jean
Charles recebeu logo após o corpo do filho retornar
para a cidade natal de Gonzales em Minas Gerais
parece pouco para estancar a dor da morte. Mas
sempre me pergunto: a dor da perda pode ser
comprada, suprida, ou mesmo abafada com algo
material? As pessoas, os prejudicados com a morte
alheia sempre esnobam os valores recebidos.
Obviamente não há valores que pague a saudade, a
falta e a necessidade do outro. Mas o que faz além
de se calar? E sem falsos moralismos, porque não
aceitar o dinheiro e prosseguir?
Três anos após sua morte, nada foi efetivamente
feito. Os policiais não foram condenados e o caso
permanece sem esclarecimentos. O que poderia ser um
resultado aceitável? Os policiais que atiraram
apodrecerem na cadeia? Serem banidos de seu
trabalho? Acho uma questão muito delicada, que o
filme não se furta de sugerir, embora não fomente a
discussão sobre.
O filme também é sobre um cidadão comum, mediano,
jovem, esperançoso, que na rotina do di-a-dia quer
tirar proveito, se divertir, construir um futuro
melhor. “Jean Charles” se apega muito mais na
realidade dos imigrantes, para fazer um sutil
retrato sobre os brasileiros que vivem longe de suas
famílias, ou de sua terra.
A complexidade de tal experiência é exposta na
personagem da prima interpretada pela atriz Vanessa
Jácomo que após a experiência com a morte do primo,
não sabe mais caber em si mesma. Cai no mundo atrás
de respostas para a grande questão que é: o que
significa viver? O foco do filme e da cena final em
tal personagem reforça essa leitura, que não deixa
de ser uma opção sufocante, utópica.
Como escapar de nos mesmos sem sair do lugar?
Ficha Técnica
Título Original: Jean Charles
Gênero: Drama
Duração: 90 min.
Ano: Inglaterra / Brasil: 2009
Estúdio: Mango Films / Já Filmes
Distribuidora: Imagem Filmes
Direção: Henrique Goldman
Roteiro: Marcelo Starobinas e Henrique Goldman