Entrevista com o escritor Z.A. Feitosa

O Editor do Portal Cranik "Ademir Pascale"  entrevista o escritor Z.A. Feitosa.
 (11/05/08)

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Z.A. Feitosa - Foto Divulgação

ENTREVISTA:

Ademir Pascale: Primeiramente, agradeço pela gentileza da entrevista. Bacharel em Administração de Empresas e Ciências Contábeis com especialização em Jornalismo Brasileiro e Comparado; quando você descobriu a vocação pela literatura?

Z.A. Feitosa: O chamamento dos livros à leitura aconteceu, muito cedo, em minha história de vida. Lia de tudo, mesmo antes de ingressar no grupo escolar para ser formalmente alfabetizado. Fui para a escola pública em 1960. Naqueles dias, somente ao completar sete anos a criança era matriculada na escola. Até lá, se tinha interesse, aprendia as primeiras letras com um parente ou tomava aulas com professora particular.
O meu gosto pela escrita, acredito, foi decorrência do amor que sempre devotei aos livros. Acho que escrever guarda alguma relação com um processo de decantação. As informações armazenadas, em razão da leitura, decantam-se no fazer literário. Isso não quer dizer que é o mero hábito de ler que transforma um indivíduo em escritor. Por outro lado, imagino que uma pessoa pouco afeita à leitura terá dificuldades para desenvolver composições literárias.
Recordo-me que, nos dias de grupo escolar, comentei com uma colega meu desejo de declamar um poema de um autor afamado numa solenidade em que se comemoraria o aniversário da professora. Quando fui formalizar minha inscrição, aquela colega havia se inscrito para declamar precisamente aquele poema. Na hora me ocorreu dizer que declamaria um poema de minha autoria. Arrependi-me, depois, por haver dito aquilo. Para não voltar atrás, em desespero de causa, embaralhei uma dúzia de frases e declamei.
Para minha surpresa, aquele arremedo de poema foi elogiado pela professora, que ficou comovida com minha incipiente homenagem poética. Aquilo tudo me deixou muito feliz. Era como se houvesse se revelado em mim um fantástico dom. Foi aquele evento o começo de tudo? Não sei.
O pai Joaquim de Aruanda, patrono de um templo de umbanda que recebe seu nome, compara o escritor com a ostra e a escrita com a pérola. Ele observa, sempre, que nem todo molusco nasce aparelhado pela natureza para, naturalmente, produzir pérolas. Apenas algumas espécies gestam espontaneamente esses preciosos glóbulos nacarados. Ele nos lembra com freqüência que a pérola se origina da irritação causada por um corpo estranho - a presença de um grão de areia, por exemplo, no corpo da ostra. Assim, a liberação do nácar, que se deposita ao redor do grão de areia, é, antes de tudo, a defesa da ostra em face de um desconforto fortuito. Ele diz que o ato solitário de escrever um livro ou um poema é parecido com o processo de formação da pérola. No seu entendimento, a obra literária forma-se, portanto, de maneira semelhante, camada sobre camada de nácar, até resultar numa brilhante conta. E adverte que também é possível, tecnicamente, cultivar uma pérola. Esse trabalho consiste em provocar uma irritação, ou seja, colocar uma esfera de concha no corpo da ostra. O que significa ser possível, tecnicamente, formar um escritor.
Eu comungo nas idéias desse sábio preto-velho. É, para mim, a consciência dessa exasperação o que nos leva para a escrita. Essa exaltação, em mim, se assemelhou a um estado transcendente de busca de identidade e de conhecimento, enquanto fonte de expansão da alma - fragmento do deus que louvo. Nalgumas pessoas essa excitação se manifesta na forma de uma sensação que se traduz na necessidade de expressar sentimentos e pensamentos.

Ademir Pascale: No total, quantas obras você já publicou?

Z.A. Feitosa: Quatro livros. E participei de algumas antologias. Três obras (Asas Queimadas – Suíte, Algolagnias – Confissões Libidinosas e Mulher Macho Sim, Senhor!) foram publicadas entre 1980 e 1984, antes do silêncio literário de 22 anos. Em 2004, graças a um amado preto-velho, que me incitou a escrever um novo livro, retomei o gosto pela escrita. Em 2007, com o apoio dos irmãos que congregam na Casa do Pai Joaquim de Aruanda , no templo umbandista que integro desde 1977, foi publicado “O Íntimo Ofício”. A quinta obra, um livro de poemas, será publicada no primeiro semestre deste ano e encontra-se em fase final de produção.

Ademir Pascale: Qual delas mais lhe marcou e por quê?

Z.A. Feitosa: Cada obra tem uma história própria e marca o autor de forma diferente. Será por isso que chamamos os livros de nossos filhos? Se eu levar em conta a boa aceitação dos leitores e o processo de produção, a obra que mais me marcou foi “Asas Queimadas – Suíte”. É um livro simples e formado por poemas singelos, que foi engrandecido pelo primoroso prefácio do professor Marcos Barrero, bem como pelas ilustrações do talentoso João Carlos Bento e, decerto, pela comovente apresentação do jornalista Carlos Eduardo Scaranci.

Ademir Pascale: Como foi o lançamento da sua obra “O Íntimo Ofício” e como está sendo a receptividade dos seus leitores?

Z.A. Feitosa: O lançamento de “O Íntimo Ofício – Memórias” foi realizado no Orkut. Não teria como fazer o livro chegar a leitores tão especiais, espalhados pelo Brasil, se não fora o Orkut. Não considero o lançamento dessa obra o estouro de vendas que experimentamos com “Asas Queimadas – Suíte”, lançado, em 1981, no “Spazio Pirandello” – um Cult da intelectualidade paulista, um misto de bar/restaurante/galeria de arte, criado por Antonio Maschio e Wladimir Soares, que lançou, em novembro de 2007, um livro-documento, contando a história daquele bar, que se entrelaça com a história daquela época.
O livro só tem recebido elogios dos leitores e, pelos comentários recebidos, percebo que essas pessoas leram a obra. Isso é um prêmio para quem escreve pelo prazer de escrever. Afinal, eu vivo da minha aposentadoria como contabilista, logo ser lido por alguém que não me viu no Programa do Jô é uma bênção. Tenho consciência, ademais, que não houve venda forçada (comprar para agradar), uma vez que nem uma só pessoa que comprou o livro pelo Orkut me conhece pessoalmente.
O número de unidades vendidas na livraria virtual da editora é relativamente pequeno, cerca de 5% do total das vendas. Por isso, acho que ainda é cedo para avaliar a receptividade do livro. Considero as opiniões recebidas até agora, uma amostra pouco representativa.

Ademir Pascale: No seu ponto de vista, quais foram as maiores mudanças e benefícios que a expansão da internet trouxe para os autores?

Z.A. Feitosa: A internet, bem como o avanço tecnológico, teve um importante impacto para a atividade literária. A título de exemplo, podemos citar vários recursos que produziram mudanças e que representam benefícios para o autor.
O protocolo de hipertexto (HTTP), que começou com conteúdos em textos, permite, atualmente, a veiculação dinâmica de diversos conteúdos, bem como fornece uma excelente estrutura para o comércio eletrônico, com impacto significativo nos custos operacionais.
Os livros, disponíveis atualmente em formato digital (e-books e audiobooks), dispensaram o uso do papel e resultaram numa facilidade para autores desconhecidos do grande público ou com poucos recursos para editar a própria obra. Cabe citar, à guisa de exemplo, o portal www.universidadefalada.com.br no qual se encontra uma gigantesca livraria em áudio para se adquirir e escutar onde quiser.
Informações que, há pouco mais de 10 anos, circulavam apenas em revistas e jornais impressos, estão ao alcance de todos nos web sites dos jornais e revistas. A Wikipédia, enciclopédia virtual, é considerada um sucesso e concorre em condição de superioridade com enciclopédias tradicionais.
Portais de divulgação de livros, tais como o www.divulgalivros.org, constituem uma forma viável de anunciar para um grande público, a custo baixo, as obras publicadas pelos autores em regime de prestação de serviço.
Existem também outros suportes: blogs, videologs e podcasts, que auxiliam na divulgação da obra literária. Além disso, o correio eletrônico abrevia o tempo de envio das mensagens escritas e se presta para envio de originais de obras para a editora.
Algumas pessoas pessimistas consideram que a internet diminui ou substitui os contatos humanos, chegando a dizer que a internet nos fez menos humanos. Acho que se trata apenas de mais um receio em face de um avanço tecnológico, o que já ocorreu noutros momentos da história. Considero a internet como uma poderosa ferramenta de comunicação e, ao mesmo tempo, uma extraordinária fonte de informações, que pode no futuro ser substituída por outra tecnologia.

Ademir Pascale: No final de 2006, eu era irredutível em questão a não participar do Orkut; não aceitava de maneira alguma ser um dos seus membros, porém, depois de observar que todos os meus amigos estavam cedendo, após muito persistir, resolvi adentrar-me neste mundo e acabei conhecendo todos os seus benefícios. Hoje mantenho uma comunidade, intitulada “Cinema é Cultura” com quase 3.500 membros. Conheci novos e excelentes amigos, incluindo você. Qual a sua opinião referente ao Orkut?

Z.A. Feitosa: O propósito do Orkut (uma comunidade virtual criada para ajudar a manter o contato entre amigos e para conhecer mais pessoas) é, em essência, muito bom.
Fiz grandes e valiosos amigos por meio do Orkut. Foi no Orkut que conheci seu trabalho em prol da cultura, que considero de inegável valor.
Para um amante da palavra escrita, o Orkut oferece um rico banquete de expressões. Além disso, eu aprendo muito com as pessoas com as quais convivo no Orkut. Sou uma pessoa de vocação solitária. E essa convivência foi enriquecedora porque me fez rever valores e padrões.
Como toda ferramenta, quero ressaltar que o valor do Orkut está diretamente relacionado com o talento ou caráter daquele que o utiliza.

Ademir Pascale: Quando o site www.feitosa.net foi ao ar?

Z.A. Feitosa: O domínio foi registrado há muito tempo, mas o site, em si, foi ao ar em 14/12/2006, dia do meu aniversário. Por isso considero esse site como um presente do meu filho, que fez os projetos gráficos dos novos livros e contribuiu para a realização da missão do Fundo de Apoio Cultural da CPJA por meio de seu coletivo de design, LunaticMindStudio.com, e desenvolveu, nas horas de folga, o www.feitosa.net.
O propósito deste portal é colocar, à disposição do leitor, informações sobre as obras e autor, bem como oferecer um canal oficial (e-mail za@feitosa.net) por meio do qual os interessados podem adquirir o novo livro com desconto promocional, bem como se comunicarem comigo, se desejarem.

Ademir Pascale: No seu ponto de vista, como está o mercado editorial brasileiro e a qualidade dessa nova safra de autores?

Z.A. Feitosa: O mercado editorial apresenta, em 2008 as mesmas dificuldades que se conhecia em 1984, quando me afastei do fazer literário para me dedicar exclusivamente ao mundo dos números, todas elas decorrentes da falta do hábito de leitura.
Há quem justifique esse quadro desolador, usando como argumento a fraca atratividade dos livros quando competem com outras mídias, o que dificulta a expansão do mercado editorial e, por suposto, interfere na formação do hábito de leitura.
Por conta da ausência de consumidores, entre 1984 e 2008, registrou-se o fechamento de muitas livrarias, assim como a necessidade de diversificação de produtos, pois algumas livrarias tradicionais passaram a vender de tudo, inclusive livros, para se manterem no mercado.

Tal situação me reporta à década de 60, quando assisti Fahrenheit 451, uma curiosa adaptação cinematográfica do romance de Ray Bradbury, dirigida por François Truffaut. A história se passa num futuro hipotético, em que os livros são proibidos, sob o argumento de que a leitura faz as pessoas infelizes e improdutivas.
Felizmente, encontramos comunidades no Orkut formadas por pessoas que gostam de ler, compostas por um grande contingente de jovens. Esse fato renova a minha fé no futuro da leitura.
No que diz respeito à qualidade dessa nova safra de autores, quero destacar que estive muito tempo apartado do meio literário. O contato que tenho com os novos é apenas pela internet. Quando estava mais enfronhado no meio, recebia muitas obras de autores novos para ler. Mesmo assim, tenho comprado livros de novos autores, em especial autores brasileiros. Algumas obras me pareceram interessantes. Outras nem tanto, em razão da forte presença de um trabalho que vou chamar de copidesque, por falta de expressão mais adequada, que deixa os livros muito parecidos e a escrita carecendo de originalidade. Acho importante reconhecer um autor pela obra e, quando possível, pela obra vislumbrar quem é o autor.

Perguntas rápidas:

Um livro: “Demian” de Hermann Hesse, o livro da minha juventude.
Um autor (a): Henry Miller, que só publicou a primeira obra quando tinha perto de 50 anos.
Um filme: Um homem, Uma mulher de Claude Lelouch, que se valeu da música de Vinícius de Moraes e Baden Powell para expressar a beleza de um amor maduro.
Um ator ou atriz: Sônia Braga, a encantadora professora Ana Maria do programa infantil Vila Sésamo.
Um dia especial: 28 de junho de 1977, nascimento do meu filho Hiroaki.
Um desejo: Ser feliz, aperfeiçoando minha escrita e publicando livros.

Ademir Pascale: Desejo-lhe muito sucesso em suas novas empreitadas. Um forte abraço.

Z.A. Feitosa: Obrigado muito, Ademir! Sei que ninguém desconhece a importância do seu trabalho, em favor da informação útil. Mesmo assim, parafraseando o professor Marcos Barrero, apraz-me dizer que seria estimulante saber que Ademir Pascale prosseguirá nessa linha, levando cinema e livros para aqueles que têm fome de cultura. 
 

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O Íntimo Ofício - Z.A. Feitosa

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*Você poderá adicionar essa entrevista em seu site, desde que insira os devidos créditos: Editor e Administrador do http://www.cranik.com : Ademir Pascale - ademir@cranik.com
Entrevistado: Z.A. Feitosa.
E nos informar pelo e-mail: ademir@cranik.com  

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