CRÍTICA - A VOLTA DO TODO PODEROSO:
Em uma conta rápida
descobri que pouco mais de vinte por cento dos
filmes que eu vi no cinema esse ano são oriundos de
um predecessor, desse montante, excluindo “Harry
Potter”, que, além de seguir uma “saga”, é um
exemplo de cinema de qualidade, todos os outros são
verdadeiros caça-níqueis sem propósito de existirem,
desde o mediano “Rocky Balboa” até a besteira
supervalorizada “Piratas do Caribe no Fim do Mundo”.
O último exemplo é “A Volta do Todo Poderoso”,
seqüência do sucesso de 2003, que chega com ares de
superprodução, mas que na verdade é mais um daqueles
filmes desnecessários, que existem só para colocar
mais um pouco de grana nos cofres dos estúdios, que
é muito inferior ao primeiro, mas que, no final das
contas deve divertir com um humor despretensioso e
até certo ponto inocente .
O principal problema dele reside diretamente em ser
uma seqüência, em reciclar uma idéia que quatro anos
atrás foi novidade, mas que agora perde um pouco da
força e do elemento surpresa, mesmo com a maioria
dos elementos do primeiro ainda presentes.
Deus (mais uma vez Morgan Freeman em um ótimo
trabalho) dessa vez resolve “contratar” o recém
eleito para o congresso Evan Baxter (o também ótimo
Steve Carrel), que no outro filme é o âncora que
disputa o cargo com o personagem principal, para
construir um arca antes que a inundação venha, ao
melhor estilo Noé, e por pura sacanagem Deus vai
fazendo o personagem se transformar, com barba
branca e tudo.
Talvez a maior diferença das duas produções, seja o
que mais dá certo nesse segundo filme, enquanto no
primeiro o personagem de Jim Carrey, Bruce, ganha os
poderes de Deus, virando uma pessoa pedante, Evan
não ganha nada, apenas uma barba que não dá para
cortar, uma fantasia de Noé e a perseguição contínua
de todo e qualquer animal que cruza seu caminho,
resumindo, ele só ganha problema.
Enquanto Carrey é espalhafatoso e repleto de
gestuais, Steve Carrel é cínico, contido e consegue
levar o filme nas costas. Desde o começo, com pinta
de esnobe que aos pouco vai sendo tomado pela
histeria e pela insanidade, para por fim alcançar a
sapiência do personagem bíblico, o ator mostra que
não é a toa que hoje é umas das coqueluches do humor
de Hollywood.
O discurso no congresso, quando ele por fim aceita
sua missão, é ótimo, e mostra todo o potencial do
ator, ao mesmo tempo que quase não acredita no que
está falando, não consegue nem pensar em tentar
fazer os outros acreditarem nele, e consegue passar
exatamente isso, em um tom meio cínico e sem
esperança.
E é exatamente isso mesmo, Carrel leva o filme e
consegue tirar água de pedra do roteiro de Steve
Oedekerk, que parece não se esforçar em nada,
fazendo algo muito aquém do que foi seu roteiro no
primeiro, além de diminuir substancialmente o
problema, focando quase que apenas um bairro
suburbano, apresentando um Deus menos onipotente,
muito mais politicamente correto e na moda, se
preocupando com o meio ambiente.
Mesmo conseguindo preparar bem toda a situação,
começando obviamente com a ironia da situação do
personagem principal não suportar animais no inicio
do filme, e ainda criando ótimas piadas, como a de
Deus no juramento de lealdade no congresso jurando
“a mim” (ele mesmo no caso, não eu), ainda peca um
pouco em separar o filme por três montagens
(seqüências de passagem de tempo com musiquinha de
fundo e um personagem fazendo um monte de coisas,
vide treino em qualquer “Rocky”), que mesmo dando
certa agilidade a tudo, é sempre meio repetitiva.
Diante de tudo isso só sobra para o diretor Tom
Shadyac fazer o arroz com feijão funcional do cinema
de comédia, e isso ele faz até com uma certa
habilidade, só se perdendo um pouco na seqüência
final, da inundação onde se sente obrigado em
mostrar onde os 175 milhões de dólares foram gastos
no filme, e deixa ela um pouco longa demais, criando
até um anticlímax.
Mas no final das contas, “A Volta do Todo Poderoso”
agrada e faz rir sem escrachos, secreções e afins
(tirando o pombinho que teima em se aliviar em cima
de todo mundo, servindo até como critica depois de
um “e Deus Salve a América”), mas se tudo isso ainda
não compensar, o público masculino ainda pode se
deliciar com a presença de Lauren Grahan no papel da
esposa do personagem principal, isso sim o melhor do
filme.
Ficha Técnica Título Original: Evan Almighty Gênero: Comédia Duração: 95 min. Ano: EUA - 2007 Distribuidora: Universal Pictures / UIP Direção: Tom Shadyac Roteiro: Steve Oedekerk